sexta-feira, 19 de março de 2010

Crônicas do Velho Mundo novo - A última crônica

Já há pouco mais de sete meses que retornei da Alemanha. Já há pouco mais de sete meses que escrevo quase nada. E já há pouco mais de sete meses que esta última crônica me pede para ser escrita. A gente, normalmente, tem necessidade de pontuar aquilo que vive, de criar símbolos para e da nossa própria existência, marcar de alguma forma aquilo que parece lembrar um derrubar ou levantar de âncoras. A questão é que alguns eventos existenciais se processam num ritmo um tanto acelerado, tornando de certa forma difícil de acompanhá-los. Bom, por inúmeros motivos, esta crônica só sai agora.

Retornei. E não foram escritas as crônicas sobre Inglaterra, Viena, a última semana em Colônia e Frankfurt e tantas outras coisas vividas muito rapidamente. Achei melhor não escrevê-las aqui. De um certo modo, escritas aqui elas não seriam mais do Velho Mundo novo, ainda que sobre o Velho Mundo novo. Porém, nestes sete meses, uma de minhas companhias foi um ruminar quase que constante sobre o que vivi do lado de lá do oceano. Sobre o que vivi do lado de fora e de dentro de mim. Foi um tempo muito bom e muito rico em experiências. Sobretudo em experiências que dizem respeito à solitude e à solidão.

Nas experiências em solitude, a gente quase sempre pensa em caminhos percorridos ou que se quer percorrer no chão da existência. Eu, pelo menos. Lembro de ter saído de várias dessas reflexões com um certo orgulho de mim. Alegre e mesmo aliviada por encontrar em mim força, dessa que a gente precisa pra viver todo dia. Nesses dias, eu me dizia que era nisso que tinha que pensar quando estivesse num mau dia, como um dia de solidão, por exemplo. Lembro de encontrar fé em Cristo e esperança, além de gratidão. Gratidão pela minha vida, pelos que fazem parte dela e por Ele. Cheguei à conclusão também de que, por mais que se tenha ao lado quem se quer ter, a vida ainda vai ser um caminho de solitude, porque tudo o que ocorre nessa vida acontece, antes de tudo, naquilo que se é e daquilo que se é só sabe quem é. Não afirmo que a vida é amargamente solitária. Hoje acredito mais que antes que é impossível ser feliz sozinho, mas só a gente sabe dos caminhos que percorre e tal conhecimento, parafraseando Davi, é maravilhoso demais, visto que é algo a que só Deus e o indivíduo têm acesso.

Nas experiências em solidão, a gente quase sempre pensa em caminhos percorridos ou que se quer percorrer no chão da existência. Eu, pelo menos. Lembro de ter saído de várias dessas reflexões com um certo amargor e desgosto de mim. Triste e mesmo angustiada por encontrar em mim desespero, desse que atravanca a vida todo dia. Lembro de encontrar uma fé em Cristo e uma esperança quase que meramente verbais, e uma gratidão que eu expressava a Ele de modo nada fluido e que precisava buscar na mente todos os motivos pelos quais agradecer. É que angústia e desespero embotam a alma e, nesses dias, a última coisa em que pensava era nos dias em que via força em mim. Cheguei à conclusão também de que, por mais que a vida seja um caminho de solitude, sempre será um caminho para se fazer acompanhada. É impossível ser feliz sozinho. E não há nada melhor do que ter ao lado quem se quer ter.

Retornei há sete meses e ainda me lembro de que uma das últimas perguntas que Katharina, que já foi personagem dessas crônicas, me fez foi: “O que você mais aprendeu neste ano?”. Com um coração pacificado e livre de qualquer proselitismo – e de qualquer presunção, é apenas meu caminho – reafirmo: foi que Deus está comigo. Tanto em Paris como em Viena, em Colônia e em Liverpool, na solitude vivenciada na alegria e na força, era Ele que minha alma encontrava. Era Ele quem eu via por detrás da ajuda e da amizade que encontrei em brasileiros e alemães. E era Ele quem eu encontrava na solidão e no desespero dos dias difíceis. Parafraseando mais uma vez Davi, concluo dizendo que maravilhosas são as Tuas obras e a minha alma o sabe muito bem.


Susy Almeida
Belém, 12/19.03.10.