“Tomé, porque me viste,
acreditaste? Bem-aventurados os que não viram e creram!”
Evangelho de João, capítulo 20,
verso 29.
Há três ou quatro anos, ouvi a pregação de um líder
cristão jovem feita por ocasião da Páscoa. Foi uma pregação bem curta, mas
muito direta, que praticamente começou e terminou com a seguinte frase: “É
preciso crer que Jesus ressuscitou dos mortos, porque não é possível ser
cristão sem crer que Jesus ressuscitou dos mortos, literalmente.”.
Embora eu seja cristã e creia no fato da
ressurreição do Cristo já há um tempo considerável, tive um sobressalto ao
ouvir essas palavras. Em primeiro lugar, porque, naquele instante, a
singularidade e a centralidade da ressurreição para a fé cristã assaltaram meu
credo íntimo, como a confrontá-lo e a inquirir sua autenticidade. Esses
momentos em que o habitual é rasgado são justamente os que proveem renovo de
sentidos e significação ao que se é. Em segundo lugar, porque, àquela altura,
eu já havia ouvido inúmeras teorias – inclusive, pretensamente cristãs – que,
para não largarem mão do que nossa mente entende e aceita como provável ou
possível, figurativizavam ou metaforizavam o texto dos Evangelhos que apresenta
o retorno de Jesus da morte. Essas teorias eram, claro, mais racionais do que crer que alguém que era morto, agora,
vive e, segundo elas, era preciso entender que a ressurreição é apenas um
símbolo de que devemos ter a fé renovada ou algo do tipo. Ver, então, um
cristão jovem, em posição de liderança e diante de várias pessoas aptas a
questioná-lo “racionalmente”, digamos, indo tão convictamente na contramão do
que teorias recentes – algumas nem tanto – afirmam sobre um fato antigo teve,
sim, seu ineditismo.
De lá para cá, lembro-me dessa pregação todos os anos. Num mundo que se gaba sempre e mais de pensar cientificamente – sem, muitas vezes, questionar as premissas políticas ou filosóficas das quais partem determinadas pesquisas científicas –, milagres não são bem-vindos, a menos que retirem alguém querido do caos de alma em que se vive, claro. Ainda assim, uma resposta natural, adequada a nossas percepções e sentidos, será buscada rapidamente, porque é esta a que é aceita. Assim, o que dizer da ressurreição de Jesus?
A questão é que é sobrenatural o que escapa à nossa percepção do que seja natural, como alguém já disse. Para quem
fundou o mundo, estabelecendo-lhe, inclusive, limites de ordem física, impondo-lhe
a irreversibilidade de praticamente tudo o que se diz, se faz e se vive aqui, o
que é natural? Confiar cegamente na
nossa percepção para decidir a própria fé, os próprios valores, enfim, a
própria vida, parece-me de uma leviandade considerável, porque valer-se somente
do que percebemos é valer-se somente do próprio umbigo. E se o umbigo oferece
péssimas perspectivas do que seja a vida, que perspectivas ele oferece do que
seja a Vida?
“É preciso crer que Jesus ressuscitou dos mortos,
porque não é possível ser cristão sem crer que Jesus ressuscitou dos mortos,
literalmente.”. Metaforizar o retorno do Cristo à vida não é crer em Cristo, é
crer, na melhor das hipóteses, num homem que foi um exemplo de moral, apenas.
E, como disse C. S. Lewis (2009, p. 70), “ele não nos deixou essa opção, e não
quis deixá-la”.
Susy Almeida
31.03.13
LEWIS, C. S. Cristianismo
puro e simples. São Paulo: Martins Fontes, 2009.